Vigilância e Controle

02/04/2020

"A arte imita a vida ou vida imita a arte"? O ser humano sempre teve um fascínio em observar e aprender com as ações alheias. O exemplo é parte fundamental na transmissão de ensinamentos como define Emile Durkheim (1858-1917), a educação pode ser compreendida como o conjunto de ações exercidas das gerações adultas sobre as que ainda não alcançaram o estatuto de maturidade para a vida social. Partindo desta orientação, elabora sua teoria da educação, propondo uma socialização metódica das gerações novas. Mas o fascínio da observação de situações em ambientes controlados, como as simulações de batalhas com gladiadores na Roma antiga e até mesmo a vergonhosa situação dos zoológicos humanos na Europa. Nessas situações existe um sadismo em exercer controle disciplinar sem ser visto, um pan-óptico, que ao mesmo tempo é um instrumento de um vontade de controle sobre o outro, também é um instrumento de domesticação das vontades alheias através da constante vigilância e disciplina, como demonstra Michel Foucault (1926-1984) no seu clássico livro "Vigiar e Punir" de 1975. (O pan-óptico é uma estrutura pensada no séc. XVII que permitia um único carcereiro tomar conta de um prisão inteira sem ser visto e vendo todos os prisioneiro a todo momento, idealizado por filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham em 1785.)

Mas imagine se ao invés de um carcereiro fosse um telespectador? Sim, você com certeza já está ligando os pontos né? "O show de Truman"(1998), uma comédia dramática dirigido por Peter Weir e tem como protagonista Truman Burbank (Jim Carrey), que tem toda sua vida televisionada. Isso mesmo, desde o seu nascimento e todas as suas ações são acompanhadas 24hrs. (Um show de realidade!) Todos os produtos utilizados por Truman, são comercializados. Suas emoções são colocadas a prova afim de criar um vínculo com os telespectadores, manipuladas de acordo com os interesses da produção do show. Lembrou algo? Com certeza né! Que programa no meio de uma pandemia tem a força de tirar o foco dos problemas e proporcionar uma votação com mais de 1 bilhão de votos, na eliminação de um participante? (1,5 bilhão de votos)

Pensado por um magnata da mídia holandesa e sucesso em vários países o Big Brother é de longe o mais famoso reality show que se consagrou no gosto do brasileiro. Está em sua vigésima temporada no Brasil, afrente de programas que tentaram a mesma receita mas sem obter tal carisma, como a "Casa dos Famosos" (SBT), "A Fazenda" (Record), entre outros, por exemplo. As emoções dos participantes são realçadas de acordo com as exibições dos cortes durante o programa, num mini relatório preparado de acordo com a direção é exibido todo dia. Quem pode ter acesso aos pacotes pagos, tem como acompanhar 24 hora por dia a vida dos Brothers. Os produtos são anunciado durante a interação dos participantes e provas dos mais diversos aspectos são elaboradas para que os participantes constantemente sejam lembrados o caráter competitivo da atração, garantindo um grande índice de ibope, com transmissões ao vivo. O programa que tem culto ao herói, vigilância, exclusão, fama, condicionamento e controle, é uma mescla de um sociedade disciplinar pelo confinamento apresentada por Foucault e uma sociedade do controle imaginada pelo francês Gilles Deleuze (1925-1995);

"As sociedades disciplinares são aquilo que estamos deixando pra trás, o que já não somos. Estamos entrando nas sociedades de controles, que funcionam não mais por confinamento, mas por controle contínuo e comunicação instantânea"

- Deleuze, Conversações, p220

O nome do programa não poderia ser um mero acaso. Big Brother é o líder totalitário do romance distópico "1984" (1949), do britânico Eric Arthur Blair (1903-1950), que escreveu sob o pseudônimo de George Orwell. No romance, após uma guerra de proporções globais, o mundo não é mais como conhecemos. Divididos em três grandes blocos políticos e totalitários que guerreiam entre si. O protagonista, Winston Smith, vive na cidade que seria Londres no futuro, integrante do bloco da Oceania, governado pelo Partido, cuja figura líder é o Grande Irmão, onipresente e onipotente, embora ninguém saiba se ele realmente existe (culto ao herói). A vigilância marca a obra, onde todos são lembrados constantemente que "o grande irmão está de olho em você". O que viabiliza tal estado é a manipulação histórica (uma das principais funções do historiador quanto seu trabalho ético é combater o revisionismo histórico, onde opiniões políticas sem baseamento em fontes se tornam oficiais), que permite o controla da memória, realizando embaraço até mesmo na dúvida de qual ano estão ou se a realidade sempre foi daquela maneira; como um dos slogan do partido "quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente controla o passado" Um dos principais instrumentos de controle neste estado é a língua que manipulada faz com menos pensamentos desviantes sejam expressados a chamada "novafala" ou "novilíngua"( a língua como um signo compartilhado, que é fundamental na aglutinação de ideias e demonstração de valores regionais. Base fundamental da formação de um imaginário nacional por exemplo - ver nacionalismo)

Mas como a arte imita a vida e a vida imita a arte" em tempos de Fake News (Manipulação midiática e histórica), grupos religiosos se alinhando ao militarismo e o descrédito da ciência, momento onde o Big Brother faz tanto sucesso o slogan do partido nunca fez tanto sentido; Guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força. E não precisamos ir tão longe para entender isso, O vencedor é o que padroniza um modelo de ser seguido na cultura atual. Você já reparou no suas mídias sociais, quais os padrões a serem seguidos? Como é sua relação com seu Instagram? O que você posta momentaneamente no seu Stories? 

Texto João Paulo Silva - Graduado em História.

Profº Emerson - Blog de História Geral/CPVAM
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